‘A obra de Paulina Chiziane transcende os limites do gênero’, diz a diretora-geral do Festival de Poesia de Lisboa

Escritora moçambicana, e autora de títulos como Niketche: Uma história de poligamia, Paulina Chiziane é a autora homenageada da edição de 2025 do Festival de Poesia de Lisboa.

Paulina Chiziane, escritora moçambicana homenageada do Festival de Poesia de Lisboa 2025. Foto de Nuno Ferreira Santos (Reprodução).

O Festival de Poesia de Lisboa já faz parte do calendário cultural da capital portuguesa. Este ano, o evento, que já homenageou nomes como Mia Couto e Adélia Prado, irá homenagear a escritora moçambicana Paulina Chiziane, romancista e poeta vencedora do Prêmio Craveirinha e do Prêmio Camões. 

Chiziane tem uma trajetória marcada pela ousadia e pelo vanguardismo na história da literatura em língua portuguesa. Ela é lida como a “primeira romancista mulher de Moçambique”, título que questiona. Isso porque a autora se coloca para além do gênero romance (que, a propósito, é uma invenção burguesa e europeia). Chiziane se apresenta, sobretudo, como “contadora de histórias”. 

Decidir homenagear Paulina Chiziane num Festival de Poesia é ‘reconhecer a dimensão poética da sua prosa’, diz Jannini Rosa, diretora-geral do Festival de Poesia de Lisboa

A escritora, editora e diretora-geral do Festival de Poesia de Lisboa (Divulgação).

A notícia da homenagem emocionou os participantes do Festival de Poesia de Lisboa. Foi uma decisão bem acolhida, especialmente considerando que a autora é hoje um dos principais nomes da literatura em língua portuguesa no mundo. No entanto, poderia causar estranhamento, uma vez que, Chiziane é mais conhecida por sua produção em prosa do que na poesia. Além disso, a autora não possui livros de poesias, apesar de já ter publicado poemas em antologias e revistas ao longo da sua carreira. 

Para Jannini Rosa,  editora, escritora e diretora-geral do Festival de Poesia de Lisboa, esse não foi um problema. Isso porque, existe uma dimensão poética, mesmo nas obras em prosa de Chiziane:

Embora Paulina Chiziane seja mais reconhecida pelos seus romances, como ‘Niketche: Uma História de Poligamia’, sua obra literária transcende os limites dos gêneros. Seus escritos exploram com profundidade temas como a identidade feminina, as tradições africanas e as dinâmicas sociais — temas que dialogam diretamente com a essência do nosso tema este ano.

Ao homenageá-la num festival dedicado à poesia, reconhece-se a dimensão poética presente em sua prosa e a força da sua linguagem literária. Paulina já declarou: “A palavra é o lugar onde tudo começa, ela tem alma. A literatura é esse espaço de lutas que utilizo para reconstruir o mundo.”

Essa visão ressalta como sua escrita, mesmo em forma de prosa, carrega a intensidade, a musicalidade e a força transformadora típicas do gênero poético.

Jannini Rosa, em depoimento para a revista O Odisseu

‘Por que conhecemos tão pouco sobre autoras africanas?’: Diretora-geral do Festival de Poesia de Lisboa pensa sobre a necessidade de ouvir vozes da África

A escritora moçambicana Paulina Chiziane (Reprodução).

Para além da questão estética e da qualidade incontestável na obra de Paulina Chiziane, também é preciso considerar o que ela representa enquanto personalidade literária. Esse fator também não foi esquecido pela equipe do Festival de Poesia de Lisboa. Na verdade, pesou na hora da escolha.

O tema foi escolhido por mim há cerca de um ano, a partir de pesquisas relacionadas às dinâmicas nas relações heteronormativas. Depois de ler o livro de Paulina sobre a poligamia, percebi que ela seria o nome ideal para compor nossa programação como autora homenageada. Além de ser uma referência na defesa de um mundo mais igualitário, Paulina é uma mulher africana e escritora, o que a coloca em um lugar de interseccionalidade que precisa ser debatido em nosso festival.

Questões como “por que mulheres são menos lidas que homens?” e “por que conhecemos tão pouco sobre autoras africanas?” são essenciais para ampliar nossa reflexão — e a escolha de Paulina Chiziane nos ajuda a dar visibilidade a esses temas.

Diz Jannini Rosa em depoimento para a revista O Odisseu.

O Festival de Poesia de Lisboa está em sua 10ª edição com o tema “Cartografias do afeto: Amar é um ato político” e acontecerá entre os dias 25 e 28 de setembro de 2025 na capital portuguesa. Para mais informações, acesse o site do Festival!

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