Conceição Queiroz, jornalista moçambicana e mediadora da mesa literária que fazia uma homenagem ao escritor Itamar Vieira Junior na Flipoços, perguntou a ele se havia um novo livro a caminho. Itamar enrolou, mas entregou a novidade que todos na plateia aguardavam. Respondeu que sim, e não só isso.

Generoso com os leitores, Itamar adiantou que já está concluindo o terceiro livro da trilogia iniciada com o famosíssimo “Torto arado” e estendida com “Salvar o fogo”, ambos vencedores do prêmio Jabuti. Teve mais. O autor baiano revelou que a próxima obra é sobre migrantes que se alocam nas metrópoles.
“É uma história que vai falar daqueles foram completamente desgarrados do chão, desgarrados da terra mesmo, aqueles que foram parar na cidade grande e tiveram que reinventar a vida de outra maneira.”
Conta Itamar Vieira Jr na Flipoços
Perguntas sobre os próximos passos do escritor, aliás, são recorrentes e surgem até em situações inesperadas. O best-seller contou que, certa vez, tirava um cochilo, de óculos escuros, durante um voo, quando acordou cutucado por alguém sentado ao seu lado que lhe questionava: “E o próximo livro, sai quando?”.
Outra pergunta de Conceição foi sobre como surgiu o interesse pela leitura. Alfabetizado por uma professora que era sua vizinha e lhe indicava livros, Itamar contou que, aos oito anos de idade, um livro da Coleção Vagalume, que encantou gerações entre os anos 70 e 90, o impressionou tanto que lhe despertou a vontade de escrever.
“Foi especial um livro da Lúcia Machado de Almeida, pode levantar a mão quem leu, que se chama ‘O caso da borboleta Atíria’ [várias pessoas levantaram os braços], olha quantos. Eu li esse livro e fiquei maravilhado. Eu vivia num lugar que tinha um quintal […] e tinha todos aqueles seres [narrados no livro] ali, aqueles insetos, borboletas, formiga, besouros […]. E aí, eu li aquele livro da Lúcia e ela transforma aqueles animais em personagens, ela humaniza, transfere humanidade para eles, mas ela cria um mundo tão rico, tão vasto, que aquilo me tocou de uma maneira tão profunda, que eu disse: ‘eu quero fazer isso.”
Conta Itamar Vieira Jr na FLIPOÇOS 2025
Próximo livro de Itamar Vieira Jr irá falar sobre migrantes da zona rural para a cidade grande, conta autor na FLIPOÇOS 2025

Itamar Vieira Junior falou também sobre seu processo de escrita, em que passa um bom tempo pensando a história antes de pô-la no papel, a importância da leitura como exercício de alteridade, e o aumento da diversidade na literatura brasileira.
“O que acontece na literatura hoje, eu acho que é uma mudança que está acontecendo na sociedade, e a gente tem uma literatura brasileira mais diversa. Temos mais mulheres escritoras, temos mais negros e indígenas escrevendo.”
Conta Itamar Vieira Jr na FLIPOÇOS 2025
Escalada em cima da hora para mediar a mesa, Conceição Queiroz, que é repórter da CNN Portugal, perguntou a Itamar quase tudo o que o público queria saber, mas coube à plateia indagar sobre o conterrâneo dele, Jorge Amado.
O geógrafo narrou, então, um episódio curioso da adolescência envolvendo seu predecessor. Um Itamar juvenil caminhava em Salvador e parou em frente a uma banca onde havia alguns livros expostos. Mirou um exemplar de “Capitães da areia” e decidiu comprá-lo, aproveitando que tinha uma graninha no bolso. Tomado por um sentimento que não sabia explicar, resolveu bater à porta do “Pelé da escrita”, apelido dado pelo jornal New York Times, disposto a conseguir um autógrafo. Quem apareceu foi a governanta. Ela encarou o jovem e disse que ia verificar se Jorge Amado estava disponível para atendê-lo, fechando a porta. Reapareceu minutos depois, convidando-o a entrar. Sem graça, imaginando que o livro seria autografado automaticamente e devolvido na entrada, aceitou o convite. Foi recebido por Jorge Amado e também por Zélia Gattai. Ao pegar o exemplar, Jorge Amado notou que havia algo errado, voltando-se para a esposa. O título estava grafado como “Capitães ‘de’ areia”. Pediu que Zélia ligasse à editora. Enquanto o escritor assinava o livro, Zélia Gattai perguntou a Itamar se ele já tinha lido um livro dela. Diante da negativa, ela pegou um exemplar da biblioteca e o presenteou com “Anarquistas graças a Deus”. O encontro com o casal não poderia ter sido melhor.
E o de Itamar com os leitores sul-mineiros também. Após o encerramento da mesa na noite do último sábado da feira literária de Poços de Caldas, que durou quase duas horas, o autor sentou-se para dar autógrafos aos fãs em uma fila que se estendia ao longo da praça onde o evento estava acontecendo.
Leia Também: Flipoços 2025: Sobre Valter Hugo Mãe, Pérsia e empatia.

